sexta-feira, 15 de novembro de 2013

das cartas coladas

Desfiz as malas e toda a bagagem - daquilo que tinha, que sabia, que era ou que pensava. Estava pronta para deixar ali os meus raios e fincar minhas raízes. Pesei a promessa no chão, marcando com os pés o caminho, que faziam a única dupla de todo aquele composto de coisas que me faziam uma só. E era só. O maço no bolso em seu fim denunciava, e atava os nós na garganta por entre a fumaça. A lata seca da cachaça negava a loucura que vinha em dilúvio, este, sob o céu cinzento. Eu me vi ali, no banco úmido da praça, balbuciando estes nós, de pronome e de laço, que não chegaram a acontecer. Entre outros bancos, tão vazios quanto os meus, caminho entre a poesia no papel que ali foi colado. Eram outros compostos que marcavam a presença e contavam um pouco sobre si e sobre o outro, e a mim batia no peito as mesmas palavras - falava de seus pés no chão e cantava a favela em sua frieza e calor. O humano. Tão humano que doía. O cartaz no banco me perguntava: a obrigação virou refúgio? Não, respondi, sem o ponto de interrogação.

sábado, 21 de setembro de 2013

as luzes nos olhos doentes, doendo, sem aplauso nem platéia, com meu sempre nariz vermelho - saí de cena. penso no tempo que passa pesado, lentamente, arrancando a casca, vagaroso e vaporoso - arranca de mim, do peito, toda promessa dita, maldita e mal criada, criadas por mim e pelo meus eus, meu deus e meus outros mil demônios. pesadas as botinas sobre meus pés descalços, cheiro de praia e promessa que o sol conta e eu custo a acreditar. 
fechou-se pro tal do balanço.

terça-feira, 11 de junho de 2013

sol ta pro sa



                                             solta prosa,
                                                  solta e leve
                                                        trata da pressa
                                                            e leva a carroça 
                                                                    de cara, a couraça
                                                                         - é Maria, é João!

                                              no meio do peito
                                                o tiro perfeito:
                                                    coração.

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Saltei da bolsa o papel e caneta que me fariam registrar - antes fosse que um click em seu rosto em plena oito horas da manhã. Falo isso porque, é isso que hoje fotografo em minha mente - deixe-me descrever:
É uma menina miúda de tudo, tão pequena, pernas e braços finíssimos, um rosto branco de cabelos bem negros escorridos pelos ombros. Menina de batom vermelho, vestida de gente grande. Carrega nas mãos um livro - que já bisbilhotei, é Nietzche! - tenho certeza ser mais pesado que ela. Senta de frente a mim no ônibus lotado. Lado esquerdo a janela que deixa entrar a luz solar das oito da manhã, deixando seu rosto ainda mais pálido - e observo um leve reflexo no vidro. Um reflexo todo negro, assim também são suas roupas. Tem cheiro de esperança, que apesar de tentar disfarçar sua leveza entre seus livros e panos pesados, seus olhos, também de criança, contam um pouco da singularidade de ser o que se é. E, se o que vejo, daria uma foto, a enquadraria então assim mesmo, junto com toda essa gente, que destonalizaria o plano de fundo e realçaria o seu vermelho. Porque assim ela o é.

sábado, 23 de fevereiro de 2013


Desde então, o relógio rodava lento e a cada hora fechada calculava vagamento sobre o que fazer pelas próximas horas, até que elas fechassem novamente, já que você não estava mais ali, nem do outro lado. E passava a hora pensando e fazendo coisa absurdas como olhar o celular por tantas vezes, como se isto bastasse para fazê-lo tocar e ver o seu nome ali, brilhando. E fico imaginando que, talvez se eu pensar bem forte em você, talvez do outro lado você também pense em mim. Às vezes tentava, inutilmente, como se fosse possível unir meu corpo ao teu, através de lembranças, estas, que doíam cada vez mais, seja por saudade, seja por mágoa, pelo amor que doei ou que deixei de dar. Lembrava de você dormindo, feito aquela música melosa da Legião, que só faz a gente pensar quando estamos assim. Às vezes concluo que era melhor ter ficado ali, abraçados daquele jeito, o cheiro do pescoço, ombros, peito, calada, agradecendo por aquele amor maroto que um dia já foi, ou era, e eu, ou nós, deixamos de ser.
Fui perdendo os modos, os gestos, as palavras, o bom tom, e tudo foi saindo meio desesperado como tem saído o pensamento, ou como tem entrado. E pairo flutuante na bolha do pensamento - densa, escura, chorosa, que entro e saio conforme gira a ciranda da roda da fortuna. A cabeça rodopiou, feito aquele símbolo louco, místico, esotérico, radiônico que me passaram, que coloquei minha própria cara adentro, como se estes cinco dias pudessem mesmo curar estes cinco anos.
Acho que não. Já faz cinco séculos que estou de frente ao relógio e ele não moveu um segundo.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

do escrever

Diz ela que, acima de tudo, é preciso ter o coração pulsando. Fiz que não senti sua dor, porque sei que é ali que ela vive toda. E é ali, entre as folhas, que ela se desagua - e desagua feito mar que desenrola aos pés da terra para saudar a vida.

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Deixe que a vida venha, tanto quanto leve - numa tragada ou embriaguez
essa viagem no tempo - esse suplício, esse tormento
Porque a vida, amigo, é corda bamba
cada passo tem sua vez.
de um jeito ou de outro sempre digo, dizendo assim, assado ou em silêncio.
tenho me sentido tão comum quanto qualquer um. mas carrego no peito um sonho que é só meu